Você tem algum critério objetivo para saber quando a opinião alheia tem valor?

CalvinDúvida33

 

Marie costumava frequentar o Clube Francês pelo menos uma vez por semana.
Não sendo sócia, ela entrava como convidada de suas amigas Sirena e Isabella.
E era nas quintas-feiras à noite que as três se dirigiam ao bar social, onde acontecia um divertido karaoke.
Naquele palco elas soltavam a voz sem a menor timidez.
E graças ao seu repertório animado, acabaram destacando-se entre os frequentadores.

No meio deles estava o diretor social do clube.
Ermelino era um sujeito popular, boa pinta, advogado de formação e… paquerador.
Nada demais, pensou Marie, a não ser pelo fato de ele ser casado.
O que imediatamente a fez desinteressar-se.
Marie era solteira e muito tranquila com essa condição.
E era essa despreocupação com sua solteirice que parecia desafiar certos homens de personalidade sedutora.
Não foi diferente com Ermelino.
Bastou meia hora de conversa com ela para que o diretor começasse a cortejá-la.
A princípio Marie não deu bola.
Deixou claro seu desinteresse e deu o assunto por encerrado.
Mas as investidas dele, além de continuarem, tornaram-se mais audaciosas.
A cada noite no bar social, Ermelino mostrava-se mais e mais inconveniente.
E passou a assediá-la também por mensagens de celular.
Marie pensou em abandonar o karaoke mas suas amigas julgaram aquela hipótese absurda.
Até que um dia sua paciência se esgotou.

Era quinta-feira e como sempre, as amigas ocupavam uma mesa do bar com alguns conhecidos.
Em dado momento, Ermelino entrou no recinto e aproximou-se.
Assim que ele ameaçou sentar-se ao seu lado, Marie reagiu.
Encarando-o firmemente, disse-lhe que ele não era bem-vindo ali.
Diante da expressão atônita do diretor, Marie acrescentou que eles não tinham nenhum assunto a conversar.
E convidou-o a se retirar.
Ermelino gelou.
Não esperava aquela reação pública.
Resistiu a sair dali mas frente à postura firme de Marie, acabou por afastar-se, humilhado.
Ato contínuo, chamou Sirena de lado e lhe disse que se Marie voltasse ao bar, seria expulsa.
Também ameaçou a sócia com uma queixa junto ao clube, pois ela era formalmente responsável pelo comportamento de sua convidada.
Marie indignou-se com as ameaças e pensou em como neutralizar Ermelino.
Decidiu chamar um advogado.
Foi quando percebeu que a notícia do confronto havia se espalhado pelo clube como rastilho de pólvora.
E daí para frente passou a receber todo tipo de opinião sobre o que fazer:
– Isabella, sempre insegura, aconselhou-a a relevar o episódio e ausentar-se por uns seis meses.
Ela tinha medo da influência do diretor e das consequências sobre sua própria imagem dentro do clube.
– Ernesto, um sócio antigo que vivia bêbado, lhe disse que desprezasse as ameaças.
Segundo ele, o diretor não tinha poder – e muito menos moral – para cumprir nada do que ameaçava.
– Ceres, também sócia e que parecia conhecer Ernesto muito bem, afirmou a Marie que este não era confiável porque era um bêbado.
Mas declarou apoiar atitudes enérgicas contra Ermelino pois ele já tinha feito outras vítimas e merecia uma lição.
– Matilda, decana no clube, disse a Marie que ficaria feliz em responsabilizar-se por sua entrada ali.
Classificou Ermelino como mau caráter e (em sua ausência…) o desafiou a retaliá-la por isso.
– E ainda Fabrizio, advogado, garantiu que o regulamento do clube não respaldava nenhuma das ameaças do diretor.
E que Marie deveria sentir-se lisonjeada com a investida de um homem cobiçado como Ermelino, ao invés de querer processá-lo.

Isso não foi tudo o que chegou a ela mas bastou para despertar-lhe mais dúvidas do que certezas.
Não era para menos:
– O medo embutido no conselho de Isabella fez Marie temer mais uma ameaça, meio nebulosa, criada pela insegurança de amiga.
– A opinião de Ernesto, embora consistente e positiva, foi desqualificada porque ele não era visto como um interlocutor confiável.
– O incentivo de Ceres apesar de animador, carecia de materialidade, o que em nada ajudava Marie.
– A proteção de Matilda era tentadora mas Marie não tinha certeza se ela era de fato imune às ameaças do diretor.
– Finalmente, a visão preconceituosa de Fabrizio fez Marie pensar que talvez seu ponto de vista predominasse no Clube.
Nesse caso as informações que ele lhe deu não bastariam para ampará-la.

Em resumo, analisando todos os palpites, Marie não chegou a nenhum consenso.
Cada pessoa a dar uma opinião, tinha um ponto de vista diferente das demais.
Cada um tinha suas próprias razões e suas próprias experiências anteriores que produziam diferentes conclusões.

Isso lhe parece familiar?
Pelo que eu me lembre, já tive vários problemas que receberam uma enxurrada de opiniões, a grande maioria sem função clara.
Então o que fazer com os palpites alheios?
Como avaliar as opiniões que chegam até nós e tirar, dentre as muitas que atrapalham, aquelas que poderiam ser úteis?
Em resumo, como identificar uma opinião de valor?

A princípio isso me parece simples.
Basta considerar que:

1. Uma boa opinião é sempre construtiva.
Mesmo que seja contrária ao seu ponto de vista, uma boa opinião sempre contribui para produzir algo positivo.
2. Boas opiniões partem de quem se envolve pessoalmente com a questão.
Quem dá uma boa opinião costuma oferecer solidariedade efetiva a quem recebe.
3. Boas opiniões não transmitem e nem despertam emoções negativas.
Logo, opiniões que embutem ameaças de qualquer natureza são totalmente dispensáveis.

É importante que essas três considerações sejam feitas sempre em conjunto.
Opiniões ruins podem até atender a uma ou duas delas.
Não consegui pensar em uma má opinião que atendesse às três*.

Haveria ainda mais coisas a se avaliar nas opiniões alheias?
Certamente.
E esse será o tema do próximo post.
Por enquanto, as três considerações apresentadas são suficientes para constituir um filtro preliminar bastante eficaz.
Elas no mínimo podem evitar que nos afoguemos em palpites que provavelmente são mais prejudiciais que benéficos.

“As opiniões comuns passam sem exame. Na maioria das vezes não as admitiríamos se lhes prestássemos atenção.” – Anatole France

Agradeço a paciência e interesse de quem lê meus posts.

*Caso o(a) leitor(a) localize uma possibilidade que contrarie minha afirmação, por favor comunique-me.
Ficarei feliz com sua contribuição.